A indústria europeia dos pneus numa encruzilhada

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Os fabricantes de pneus veem com preocupação o chamado «Pacto Industrial Limpo», iniciativa apresentada no passado dia 1 de fevereiro no âmbito da União Europeia (UE), cujo objetivo é impulsionar a transição para uma economia mais sustentável através da redução das emissões de carbono e da promoção de práticas industriais que respeitem o ambiente

Na qualidade de representante de uma parte essencial da cadeia de valor automóvel, a Associação Europeia de Fabricantes de Pneus e Borracha (ETRMA) apoia veementemente os esforços para garantir um futuro competitivo e sustentável para a indústria automóvel europeia. Os pneus não são como qualquer outro componente do veículo, com o qual os condutores podem nunca ter de interagir. Os pneus são substituídos, em média, quatro vezes durante a vida útil de um veículo e deles depende o desempenho do veículo em termos de segurança, impacto ambiental, consumo e duração da bateria, no caso, dos veículos elétricos. É por isso que devem ser considerados um produto de consumo, bem como um componente, pelo qual o consumidor é responsável pela escolha e manutenção.

Reconhecendo que o setor dos pneus e da borracha é crucial para o setor automóvel e para o ecossistema da mobilidade em geral, a ETRMA partilha neste artigo as principais recomendações políticas da associação, destinadas a apoiar a dupla transição europeia e a contribuir para a competitividade, a sustentabilidade e a inovação do ecossistema automóvel europeu.

Estas recomendações estão em consonância com o relatório de Draghi sobre o futuro da competitividade da Europa e com os objetivos estratégicos do Pacto Ecológico Europeu, da competitividade digital e da eficiência do mercado único. Ao implementar estas medidas, a Europa pode reforçar a sua vantagem competitiva no setor automóvel global, garantir a segurança económica e impulsionar o crescimento sustentável sem comprometer as normas ambientais.

Não há soluções milagrosas
A indústria europeia de pneus tem sido um bastião da indústria transformadora europeia, com uma contribuição total de cerca de 44 mil milhões de euros para o PIB da UE e criando um emprego total de quase 500.000 pessoas. Os elevados custos da energia, da mão de obra e das matérias-primas, aliados à forte concorrência dos preços dos pneus produzidos fora da UE, tiveram um impacto negativo na competitividade da indústria europeia de pneus, que agora precisa de um impulso, tal como o resto do ecossistema automóvel.

As recomendações abaixo não são uma solução milagrosa, mas visam criar um ambiente legislativo propício ao aumento da competitividade, minimizando os encargos burocráticos decorrentes de legislação anterior, como o Regulamento da UE sobre a desflorestação, ou da falta de harmonização da UE, como no caso dos critérios de fim de vida útil dos pneus. Estas devem ser acompanhadas e apoiadas por uma estratégia mais ampla, que considere toda a cadeia de abastecimento automóvel como crítica, reduzindo a burocracia e avaliando cuidadosamente todos os instrumentos à disposição da Comissão que possam ter impacto nos preços de produção. A ETRMA está pronta para continuar esta reflexão em conjunto com as três instituições, a fim de garantir que qualquer futura estratégia automóvel tenha em conta as especificidades da indústria dos pneus e resolva os desafios comuns de todo o ecossistema automóvel.

Principais recomendações políticas
Para alcançar progressos rápidos e significativos, a ETRMA insta a Comissão Europeia a dar prioridade às seguintes recomendações políticas:

Estabelecer regulamentação específica para acesso aos dados dos veículos
Garantir o acesso regulamentado aos dados dos veículos permitirá que as partes interessadas da indústria aproveitem essas informações para inovar na segurança e eficiência dos transportes. Esta iniciativa já tinha sido prevista pela Comissão Europeia durante o mandato legislativo anterior e pode ser priorizada. Os pneus equipados com sensores fornecem dados valiosos sobre as condições da estrada, o estado dos pneus, os padrões de condução e muito mais. Ao permitir o acesso regulamentado a esses dados, as partes interessadas podem desenvolver serviços que melhoram a manutenção preditiva, a gestão de frotas e a condução ecológica, beneficiando tanto os utilizadores privados como as autoridades públicas. Esta medida facilita um ecossistema de transportes mais seguro e eficiente, apoiando simultaneamente os objetivos da UE em matéria de competitividade digital e sustentabilidade. Ao mesmo tempo, capacita os consumidores para assumirem uma responsabilidade ativa pela sua condução e segurança.

Harmonizar os critérios de fim de vida útil dos pneus
Ao normalizar os critérios relativos aos resíduos, a UE pode acelerar os benefícios para os mercados de reciclagem e os objetivos da economia circular. O artigo 6.º do Regulamento Quadro relativo aos resíduos permite o desenvolvimento desses critérios para os pneus através de legislação derivada e pode, por conseguinte, ser considerado prioritária. Uma economia circular forte é essencial para a segurança dos recursos da Europa. A proposta de Lei da Economia Circular (2026) deve eliminar as barreiras regulamentares e harmonizar as normas para a recuperação e reciclagem de materiais (tais como os critérios harmonizados para o fim do estatuto de resíduo dos materiais derivados de pneus). No caso dos pneus, a Comissão Europeia já tem mandato para o fazer, e esperamos que este novo impulso político permita a publicação destes critérios muito antes de a Lei da Economia Circular entrar em vigor. A indústria dos pneus já consegue recolher mais de 95% dos pneus em fim de vida. As políticas devem ajudar a expandir o mercado de materiais secundários e melhorar os programas de responsabilidade alargada do produtor.

Promover os pneus recauchutados
Incentivar a adoção de pneus recauchutados para camiões e autocarros através de incentivos financeiros, contratos públicos e iniciativas de sensibilização dos consumidores. Estes esforços estão em consonância com os objetivos da UE em matéria de economia circular e as suas metas climáticas. Os pneus recauchutados reduzem significativamente a necessidade de matérias-primas virgens e diminuem as emissões associadas à produção de pneus. Constituem um meio eficaz de prolongar o ciclo de vida dos pneus, mantendo os padrões de segurança e desempenho. Esta medida contribui para atingir as metas da economia circular, eficiência de recursos e redução de emissões. A promoção de pneus recauchutados também apoiará os objetivos mais amplos de sustentabilidade da UE
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Promover pneus com melhor desempenho
Desde 2012, os consumidores podem ver as características ambientais e de segurança dos pneus através da etiqueta. Os pneus com melhores características devem ser apoiados através de critérios nos contratos públicos e privados, bem como incentivando os consumidores nas suas escolhas. Esta seria uma forma virtuosa de aumentar a segurança e o transporte ecológico, garantindo ao mesmo tempo que os investimentos da indústria em tecnologias ecológicas sejam recompensados. A revisão dos contratos públicos e privados deve promover ativamente a etiqueta dos pneus e incentivar a utilização de pneus com melhores prestações, a fim de garantir a rentabilidade dos investimentos da indústria e a melhoria da segurança dos transportes e dos resultados ambientais. Os pneus de alto desempenho podem melhorar a segurança rodoviária, reduzindo as distâncias de travagem em até 4 comprimentos de carro e diminuindo o consumo de combustível em até 7,5%, resultando em reduções de CO2.

Garantir a disponibilidade de borracha no mercado europeu
A indústria dos pneus depende de países terceiros para o fornecimento de borracha natural, bem como de outros materiais utilizados nos pneus. A abordagem do Pacto sobre as matérias-primas críticas deve incluir uma estratégia dedicada à borracha, que garanta o reconhecimento a longo prazo da borracha natural como essencial para a resiliência europeia. A borracha é essencial para os pneus e para inúmeros componentes automóveis, pesando, no total, tanto quanto os quatro pneus combinados. É necessário implementar estratégias complementares para garantir uma aplicação harmoniosa do Regulamento da UE relativo à borracha e apoiar a disponibilidade de borracha no mercado europeu, através da monitorização do mercado e do apoio à economia circular. Sem incluir o produto acabado, a competitividade dos fabricantes europeus seria ainda mais reduzida, numa altura em que produzir na Europa já é quase três vezes mais caro do que na Ásia.

O presente artigo também está disponível para leitura na edição impressa ou online do Anuário da Revista dos Pneus, aqui.