Reparação independente enfrenta obstáculos
A reparação automóvel na Europa enfrenta diversos obstáculos devido a uma combinação de fatores económicos, tecnológicos, regulatórios e ambientais. As associações europeias do mercado de pós-venda, incluindo a Figiefa, elaboraram um documento que apela à mediação de Bruxelas para pôr termo às práticas que dificultam as reparações pelo setor independente
A declaração conjunta emitida pelas Associações apela a medidas mais rigorosas para garantir a reparabilidade dos veículos, uma questão que consideram crucial para os consumidores, a sustentabilidade ambiental e a economia europeia. Esta proposta surge no contexto das negociações para a aprovação do futuro regulamento MVBER relativo aos requisitos aplicáveis à conceção de veículos e à gestão de veículos em fim de vida, que ainda se encontra em processo parlamentar, e que os operadores independentes do mercado pós-venda querem aproveitar para introduzir medidas que facilitem e garantam a reparabilidade dos veículos a curto, médio e longo prazo. Para os signatários, regulamentos como o MVBER, têm garantido uma “concorrência leal” entre os fabricantes e as empresas independentes, mas a situação, na sua opinião, está a mudar: a falta de peças sobressalentes e o aumento da complexidade dos componentes eletrónicos tornaram a reparabilidade dos veículos modernos cada vez mais complicada, dificultando o funcionamento do setor independente. Para a Figiefa, a incapacidade de reparar um veículo a preços acessíveis pode levar a despesas inesperadas, desde reparações dispendiosas até à necessidade de substituir um automóvel muito antes do previsto.
Para estas associações, a possibilidade de reparação não afeta apenas os proprietários de veículos, mas vai muito além disso. O próprio mercado de pós-venda também está em risco devido às estratégias competitivas ofensivas dos fabricantes não europeus que impedem a reparação e a reutilização, pondo em causa os modelos de negócio de todo o ecossistema do mercado de pós-venda. O documento salienta que a situação tem também implicações ambientais e estratégicas: Prolongar o tempo de vida dos veículos através da reparação e reutilização é essencial para reduzir a utilização de recursos e apoiar a independência da UE em relação às importações de matérias-primas essenciais, a maioria das quais está nas mãos dos chineses.
Reparação de baterias VE mais difícil
As baterias dos veículos elétricos são um ponto-chave nesta discussão. Representam 30-40% do custo total de um veículo e têm um impacto significativo na sua pegada de recursos. No entanto, como salienta a Figiefa, algumas conceções atuais tornam difícil ou mesmo impossível a reparação destas baterias. Por exemplo, a utilização de resinas e materiais que selam os módulos impede a sua substituição em caso de avaria. Estas práticas não só aumentam os custos para os consumidores, como também geram um desperdício desnecessário de recursos. Em resposta, os operadores do mercado pós-venda estão a exigir regulamentação que torne a possibilidade de reparação das baterias um requisito obrigatório.
Peças sobressalentes para 20 anos
O documento apela igualmente à garantia da disponibilidade de peças sobresselentes a preços justos e não discriminatórios durante, pelo menos, 20 anos após a saída do veículo do mercado. A disponibilidade de peças sobresselentes é necessária para a reparação. As práticas contratuais dos fabricantes europeus preveem geralmente a disponibilidade de peças durante, pelo menos, dez anos, mas alguns fabricantes não europeus tendem a negligenciar o serviço pós-venda e a impor prazos de entrega muito longos para as peças, ou mesmo a não as fornecer de todo. Outra prática preocupante no sector é a “gigacasting”, uma técnica que substitui centenas de peças individuais por uma única estrutura de grandes dimensões para reduzir os custos (principalmente no processo de fundição, em que é feita uma grande estrutura metálica em vez de muitas peças pequenas montadas). Embora isto possa ser eficiente em termos de produção, torna muito difícil a reparação e a substituição de componentes individuais. Os operadores independentes exigem que estas práticas sejam regulamentadas para proteger a possibilidade de reparação e a sustentabilidade do mercado.
O software como peça sobresselente
Com o avanço da tecnologia, os veículos dependem cada vez mais dos sistemas operativos e das atualizações de software. No entanto, a falta de garantias quanto à continuidade destas atualizações pode reduzir significativamente o tempo de vida dos veículos, mesmo quando o hardware permanece funcional. Para resolver este problema, os operadores propõem que as atualizações de software sejam obrigatórias durante, pelo menos, 20 anos – o mesmo período de tempo que as peças sobressalentes -, um período que corresponde ao tempo de vida médio dos automóveis. Esta medida permitiria aos consumidores manter os seus veículos plenamente operacionais e evitar a obsolescência prematura, afirmam.
Índice de reparabilidade para VE
Os operadores independentes pedem que os dados necessários à reparação, desmontagem e manutenção sejam acessíveis gratuitamente durante, pelo menos, 20 anos para as oficinas e os operadores independentes. Além disso, propõem a criação de um índice de reparabilidade para os veículos elétricos, o que permitiria aos consumidores tomar decisões informadas e incentivar melhores práticas por parte dos fabricantes. Estas medidas são essenciais para garantir a sustentabilidade do setor, incentivando a conceção que facilita a reparação, manutenção e reciclagem. É essencial que este regulamento garanta a concorrência leal e o acesso à informação técnica para o mercado independente de pós-venda, promovendo um modelo que beneficie tanto o ambiente como os consumidores.
Poderá também consultar este artigo na edição impressa ou online do Jornal das Oficinas nº221, aqui.